A demissão é um momento delicado para o trabalhador, emocional e financeiramente. Para atenuar esse impacto, o recurso do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), direito do trabalhador há quase 60 anos, é fundamental para ajudar no custeio das despesas enquanto não surge uma nova oportunidade de trabalho.
O problema é que, infelizmente, muitos empregados descobrem, após o desligamento, que não poderão ter acesso a essa poupança porque a empresa deixou de efetuar os depósitos do dinheiro, descumprindo a lei.
No Ceará, 1,236 milhão de trabalhadores passam por essa situação e perdem, em média, R$ 2,6 bilhões por ano, estima estudo da Organização Não-Governamental Instituto Fundo de Garantia do Trabalhador. Os números são baseados em dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e em dados da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN).
Desligado de uma empresa no fim do ano passado, Junior Cardoso deixou de receber cinco anos do Fundo de Garantia que não estava sendo depositado, totalizando cerca de R$ 7 mil. Enquanto estava empregado, ele tinha ciência de que o empregador não estava efetuando os depósitos, mas a empresa dizia que o pagamento ocorreria quando o trabalhador fosse demitido.
“Falaram que no momento em que nós fôssemos desligados a empresa faria o depósito, o que não aconteceu. Cinco anos sem depósito”, afirma Junior, que tinha planos de usar o recurso para se manter. Atualmente, está desempregado e pretende entrar na Justiça para reaver o dinheiro. “Vou esperar mais uns meses. Caso eles não paguem, aí sim vou procurar a Justiça”.
Conforme o levantamento, seis mil empresas no Estado – incluindo o empregador de Junior – estão inscritas na Dívida Ativa da União, correspondendo a R$ 884,7 milhões em FGTS não depositado. A estimativa é que esse valor corresponda ao fundo de 129 mil cearenses.
O estudo estima também que mais de 25% dos negócios (ou 1.517 empresas) que não depositam o fundo de garantia dos trabalhadores no Ceará ainda não estão inscritas na Dívida Ativa da União, representando 32,2 mil cearenses sem receber R$ 221,1 milhões em FGTS.
Empregados que recebem por fora
O estudo estima ainda que 208 mil trabalhadores no Ceará recebem parte do salário por fora e considera ainda, no cálculo de empregados que perdem FGTS, os 1,028 milhão de empregados que trabalham sem carteira assinada.
O presidente do Instituto Fundo de Garantia do Trabalhador, Mário Avelino, pontua que ainda há muito desconhecimento em relação ao FGTS, o que acaba prejudicando o trabalhador. “Muitos acham que o dono do fundo é a Caixa, o governo, mas o dono é o trabalhador”, enfatiza.
“Tomando como base o rendimento médio mensal da massa trabalhadora ocupada no Ceará de R$ 1.999, dado mais recente do IBGE, e considerarmos 12 meses, mais décimo terceiro, mais um terço, significa que o trabalhador que não tem o FGTS depositado perde R$ 2.132 por ano. Em cinco anos, são R$ 10.661 de perda. E se for demitido sem justa causa, perda de multa de 40%: R$ 4.264”, exemplifica Avelino.
Sobre a prática de recebimento de salário por fora, o caixa 2, Avelino destaca que a priori o trabalhador pode achar uma boa ideia ganhar um “salário fixo na carteira e um valor a mais por fora”, mas que na realidade ele vai estar perdendo em vários âmbitos.
Para além disso, há a falta de opção e o medo de o trabalhador ficar sem renda alguma, restando aceitar propostas precárias. “Essa pessoa acaba desconhecendo que, quando for se aposentar, tirar férias, tudo isso será em cima da base salarial da carteira, então ela será prejudicada. É algo infelizmente muito comum no emprego doméstico”.